sábado, 15 de setembro de 2012

Certezas

Nós somos como uma folha de papel que foi rasgada e que, miraculosamente, não se apagou ou desfez com  os ventos outonais e as chuvas de Inverno. Pedaços de vida que não foram destruídos com o novo despertar de vida típico de Março e que não amarelaram à medida que o sol voltava a ganhar forças. Uma e outra vez.

É uma estranha resiliência, a nossa. Que nos faz conhecer mais que o que era suposto e ainda aceitar, um no outro, o que à partida deveria ser repugnante e não mais que um ponto final e um terminar de capítulo.

Era suposto, num sentido lógico e habitual, que a nossa história que começou com uma ferida aberta tivesse acabado com um movimento de mãos que rasgasse ainda mais a pele e nos tornasse mais amargurados.

Mas não foi assim que aconteceu. Aconteceu alguém que já fez muito mal a fazer o bem a outro alguém. Aconteceu uma pessoa fechada aceitar abrir-se aos poucos. Aconteceram as confissões de segredos inconfessáveis e as reacções inesperadas. E estranhamente aconteceu um cicatrizar agradável. Por vezes doloroso, mas agradável.

Encontra-mo-nos na perdição. No ponto em que o céu quase cai e o ar é rarefeito. Em que as lágrimas já não caem de tão austera é a seca. Numa conversa entre desconhecidos em que o álcool amargo quase sabe a doce entre as palavras.´

Aquela noite, aquela em que nos conhecemos, foi a última. A última em que nos sentimos sós. Ao poucos, as nossas mágoas abafaram-se uma à outra. E nada poderia dar mais certo que duas pessoas erradas.

[Este é um conto que escrevi, parte da secção "A imaginação também fala!"]

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